A
turbulência política criada pelos problemas económico-financeiros na Europa,
remete-nos a todo o momento para a segunda guerra mundial, suas causas e suas consequências.
Se o conflito Israelo-palestiniano é consequência directa das resoluções
tomadas com o desfecho da guerra, já os problemas da Rússia e do leste europeu,
que teimam em despontar a curtos espaços de tempo, se enquadram tanto nas
causas da guerra 39-45 como no seu desfecho. Quanto à Alemanha, agora, como
então, é o centro disto tudo. Assim, o assunto da segunda guerra mundial
sobrevirá sempre que tentemos discutir, para compreender, o nosso mundo.
Hoje
trago um documento datado de 1942,
composto e impresso na Imprensa do Barreiro – 30’000 ex. – Lisboa. Trata-se
de uma simples folha impressa, com um formato muito próximo de A4, dobrado ao
meio, apresentado em A5, portanto, e consta alegadamente numa palestra radiodifundida de António Eça de
Queiroz
Transcrevi
e apresento-o abaixo, por motivos de facilitar a pesquisa e a leitura, mas
disponibilizei a sua digitalização integral na Página/separador 2.ª Guerra
O ressurgimento do
espírito nacional pelo fortalecimento do espírito legionário
Palestra radiodifundida de ANTÓNIO EÇA DE QUEIROZ
Não
há legionário que não recorde com nobre entusiasmo aquela noite de 28 de Agosto
de 1936, em que milhares de portugueses aclamaram, no Campo Pequeno, a ideia de
ser criada uma força voluntária para a defesa de Portugal contra a ameaça
comunista.
Não
há legionário que não recorde aqueles meses que se seguiram de intensa
preparação legionária. Pelo país inteiro homens de todas as classes e
proveniências enchiam as paradas dos quartéis e, comandados por uma “elite”
incansável de oficiais de terra e mar, aprenderam o manejo das armas a fim de
se prepararem para as possibilidades ameaçadoras de uma batalha imediata.
O
momento era de perigo. O comunismo jogava em Espanha a sua primeira cartada
militar para a subversão dos princípios da ordem europeia e da civilização
ocidental. Todos o sentiam e compreendiam e por isso fizeram pesados
sacrifícios. Foram momentos magníficos. O país via nascer e crescer com um
suspiro de alívio uma poderosa força voluntária, força que seria mais uma
barreira oposta aos velhos desígnios de Moscovo: a revolução e a ideia
comunista alastradas ao mundo inteiro!
* * *
Mais
tarde, a eminência do perigo, na sua forma violenta, esbateu-se. As tropas
nacionais de Espanha derrubavam e aniquilavam as hordas vermelhas ”del frente
popular” e as brigadas internacionais de sinistra memória… o comunismo sofria
ali a sua primeira grande derrota militar.
Então
pouco a pouco, com a diminuição do perigo tangível, a actividade legionária
abrandou, sucedendo-lhe um período de acalmia…
O
ritmo dos exercícios tornou-se mais compassado, o espírito de arrancada e
sacrifício diminuiu. Dizia-se, inconsequentemente, que o perigo fora afastado,
e a alguns até parecia que a Legião poderia licenciar-se, conservando-se apenas
uma força simbólica que deveria limitar-se a uma acção de carácter social. A
clara chama que um grande vento de patriotismo ateara ardia menos alta… o
perigo fora afastado.
Era
este um erro profundo, direi mais, um erro criminoso, pois é crime ser cego,
quando a evidência dos factos está, contudo, à vista, e é crime ser surdo,
quando o rumor da catástrofe se sente claramente, logo que se presta o ouvido.
Nesse
erro não incorreu o comando legionário. Não podendo manter ao rubro dos
primeiros momentos o esforço militar da Legião, resolveu aguentá-lo, tornando-o
menos áspero, mas conservando intacta a força material existente, ligando
sempre mais as obrigações e o ideal legionário à orgânica do Estado, o que, a
breve trecho, deu à Legião Portuguesa uma solidez moral e uma consistência de
acção muito superior àquela que tantos lhe supõem e que o adversário, na sua
incompreensão, lhe nega.
Avisado
foi o comando, visto que, por esta forma, nos conservou uma força que é hoje
mais uma das salvaguardas da nossa existência de portugueses livres e do Estado
Novo, que bem podemos considerar como o mais forte baluarte da nossa
independência como nação, dos nossos direitos e crenças como homens.
* * *
Nisto
estávamos em 1941, quando dos acasos da guerra surgiu o imenso conflito
germano-soviético.
De
novo se alcançavam em armas as hordas de Moscovo. De novo surgiu o perigo na
sua forma violenta – mas já se não tratava apenas da escória das brigadas
internacionais que haviam tentado assassinar a Espanha, era a força inteira da
máquina de guerra comunista voltada contra a Europa toda. Então se pode
verificar quanto se enganavam aqueles que julgavam afastado e debelado o perigo
comunista.
À
gigantesca força do exército alemão vimos oporem-se as hordas inumeráveis do
exército vermelho, e todos, excepto aqueles a quem compreender não era
conveniente, compreenderam o incomensurável risco que ameaçara, ameaçava e
ameaça o continente europeu.
Todos
puderam avaliar as monstruosas proporções do arsenal de Moscovo e sentir a
magnitude da catástrofe que nos assolaria, se a iniciativa do ataque tivesse
sido tomada pelo comando soviético ou se a fortuna da guerra tivesse feito
pender a balança para o lado de Moscovo!
Deus
seja louvado, essa iniciativa foi-lhe arrebatada, e foi imenso o desgaste que
sofreram as forças comunistas. Foi esta uma vantagem salvadora, mas não
definitiva, já que não prostrou por completo o adversário, e que não pode
evitar o esforço teimoso e renovado da propaganda comunista a minar, a
conspirar, a comprar braços e consciências em todas as regiões da Europa e do
globo, para acudir ao monstro escarlate, ferido sim, mas ainda vigoroso, que
punha à dura prova os soldados da cruzada que, do Mar Ártico ao Mar Negro,
atacam o comunismo e defendem a Europa.
* * *
E
sobreveio o inverno, este inverno inclemente de 1942, que conseguiu parar os
soldados europeus na sua marcha em frente para uma vitória que já parecia certa
e que, assim o cremos, apenas foi retardada.
Não
podemos duvidar do triunfo, mas é certo devermos constatar que os imensos
golpes sofridos pelo exército vermelho lhe não tinham roubado uma notável
capacidade de reacção. Novas hordas se
formaram, mal ou bem os seus chefes as equiparam e com um insano desprezo pelas
perdas, protegidos pelos rigores da invernia a que estão habituados e pela
estratégia defensiva das forças europeias, encontraram energia bastante para se
arremessarem ao ataque.
Isto
prova insofismavelmente o grande poder do inimigo a derrubar. Isto prova-nos
com eloquência que o perigo ainda existe latente e formidável. Isto prova-nos a
demência de todos aqueles que julgam que a acção legionária já não tem para
subsistir as razões de 1936, e que são imbecis ou traidores aqueles que
declaram absurda, por desnecessária, a rexistência da Legião Portuguesa.
Por
mais qua a ofensiva soviética tenha fracassado, por mais que se desgaste
batendo-se no vasto interior da Rússia, ela foi um compasso de espera
amplamente aproveitado por um adversário que nada esquece. Ateou um grande
movimento de reacção e propaganda nas massas comunistas, comunisantes e
comunisadas do mundo inteiro. Em toda a parte a acção lateja e toma corpo.
Disfarçada
sob mil formas, a propaganda comunista trabalha sem descanso. Passeia na rua
com o povo, entra na oficina e na fábrica, insinua-se na repartição, trava
conhecimento e simula amizade, excita sabiamente à revolta e à sabotagem,
aproveita o despeitado e o falhado, acirra o invejoso, oferece o poder ao
ambicioso e espalha a corrupção do ouro. Joga com as misérias dos desgraçados e
com o terror do avarento. Senta-se à mesa dos cafés, alicia, comenta com
habilidade as notícias da guerra na Rússia, dirige subtilmente conversa,
fornece o argumento preciso, inventa e espalha o boato. Infiltra-se nas salas;
elegantemente derrotista, escarneia a existência do perigo, faz epigramas e
críticas venenosas, torce e deturpa as verdades, provoca o escândalo. Invade a
revista e a imprensa, onde , sob máscaras mal afiveladas, insinua, deturpa e
mente. Forja a calúnia e alimenta a guerra dos nervos.
Está
em toda a parte, vive em todos os meios, mais ou menos invisível, trabalha,
actua, corrompe.
Encontro-a
no cavalheiro que não crê no perigo comunista, e que nos pinta uma Rússia
ordeira e já burguesa; naqueles que odeiam o Estado Novo porque não conseguem
emprego ou os obriga a sacrifícios; no idiota que afirma peremptório que uma
vitória soviética não implica uma vitória da política comunista; no cronista de
guerra que, dissimulado sob palavrões técnicos de estratégia e táctica, comenta
a campanha da Rússia com uma má fé
flagrante; no estadista que, através da rádio, nos diz que para alcançar os
seus fins os exércitos soviéticos marcharão através da Europa até onde seja
necessário; no orador que proclama com gravidade que ao Sr. Estaline se pode
confiar sem receio, ao terminar a guerra, a reconstrução política da Europa. Em
todos aqueles que por aí declaram que o comunismo evoluiu e é hoje um caso
nacional russo que não pretende a universalidade; nos que se dizem espíritos
liberais e democráticos, nos “reviralhistas” que preferem tudo, incluindo o
comunismo, ao actual estado de coisas português. Vemo-la infinitamente
perigosa, engrinaldada de atractivos, nos filmes de cinematógrafo que inundam e
corrompem o mundo inteiro. Observamo-la no mal contido afã com que certas
pessoas decoram e comentam o comunicado russo. Notamo-la em todos aqueles que
encolhemos ombros, quando se lhes fala no perigo soviético ou se abespinham e
nos chamam germanófilos e belicistas, quando desejamos a derrota comunista.
Existe,
evidentemente e notável, só não lhe dando atenção quem por índole covarde fecha
os olhos à verdade ou quem a nega por preferência.
São
mil as formas e as manhas. É uma grande, uma teimosa ofensiva; é a tentativa
lógica de minar, de perturbar a ordem nas retaguardas europeias, enfraquecendo
as nações pela ameaça da revolta e do medo. É a ofensiva do desespero, no qual
o comunismo põe tudo em jogo, na esperança de colher resultados favoráveis,
antes, se possível, e durante aquilo que Moscovo teme, neste momento, acima de
tudo mais e com ela o grande ajuste de contas em que tantas forças morais e
materiais da Europa se vão lançar ao assalto da máquina de guerra soviética que
aguenta e protege a alma escarlate do comunismo mundial.
* * *
Se
eu desta maneira mostro a extensão do perigo, a força e a astúcia da propaganda
inimiga, é porque os conhecemos e porque estamos alerta. Um perigo e um inimigo
cujos valores se não ignoram, são elementos que se sabe onde e como combater…
mais fáceis, portanto de vencer. Pois já que os conhecemos, saibamos
defrontá-los. Não nos faltará, decerto, nem a coragem nem a decisão precisas
para, sem temor e com entusiasmo, redobrarmos de energia neste combate que há
25 anos nunca deixou de existir e que alcança hoje o seu terrível apogeu.
Eu
não creio que exista um único legionário português que oponha uma contradição
às minhas afirmações. Não o creio; mas se por acaso existe, esse não é
legionário e não merece a honra de considerar-se português – consciente ou
inconsciente é um amigo da Rússia soviética, um adepto da foice e do martelo,
e, como tal, um imigo que deve ser eliminado!
Julgo
que estamos todos de acordo… O perigo existe igual, perfeitamente igual àquele
que existia em 1936. Para lutar contra ele, doa a quem doer, custe a quem
custar, devemos estar preparados e, recalcando dúvidas ou receios inglórios,
prontos cada dia com mais firme vontade a todos os sacrifícios; a combater sem
tréguas, por todas as formas ao nosso alcance, este inimigo implacável que, a
não aniquilar-se, será a o ariete que deixará por terra o bastião de paz, de
ordem e de prosperidade que as fortes mãos de Salazar souberam construir, para
glória sua e nossa, sobre as ruinas que havia deixado em Portugal a política
demo-limeral precursora da anarquia soviética.
E
assim, fortalecendo o espírito legionário, daremos novo alento à obra
maravilhosa do ressurgimento nacional, que só pode vingar e durar o
aniquilamento total do espírito comunista.
O
que é que está em jogo? É a liberdade da humanidade cristã ameaçada
terrivelmente pela mais execrável das tiranias ideológicas.
É
o claro momento da civilização europeia ameaçado pela mais abominável ditadura
da escravização moral e material.
São
os princípios, as ideias, as tradições, o sagrado património que nos foram
legados por oito nobres séculos da História gloriosa.
É
Portugal! É a paz, a tranquilidade desta nossa abençoada e querida terra
portuguesa!
Temos
a fortuna de sermos guiados por grandes chefes. Tenhamos confiança neles,
absoluta confiança. São eles que, a par das nossas consciências, dão a palavra
de ordem e nos mostram o caminho na luta contra o comunismo. Não lhes faltemos,
nem a eles, nem a nós próprios, para que um dia a geração que nos há-de seguir,
salva pelo nosso esforço, possa dizer com orgulho e com reconhecimento: eles
foram bons portugueses, bons cristãos e bons soldados na cruzada vencedora da
Europa contra o comunismo.
Composto e impresso na Imprensa Barreiro – 30.000
ex. – Lisboa, Julho de 1942
NOTA:
António d’ Eça de Queirós, 28/12/1889 – 16/5/1968
Foi oficial do exército, escritor, comissário a várias
exposições internacionais, presidente da direcção da Emissora Nacional de
Radiodifusão, grande oficial da Ordem de Cristo…
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